terça-feira, outubro 03, 2006

A Segurança, Higiéne e Saúde no Código do Trabalho e o Papel da Inspecção Geral so Trabalho

III CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DIREITO DO TRABALHO

TRABALHO FINAL 2004


A SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE NO CÓDIGO DO TRABALHO
E O PAPEL DA INSPECÇÃO GERAL DO TRABALHO

ABREVIATURAS E SIGLAS UTILIZADAS:

IGT- Inspecção Geral do Trabalho
SHST- Segurança, higiene e saúde no trabalho
OIT- Organização Internacional do Trabalho
IRCT- Instrumento de Regulamentação Colectiva do Trabalho
CT- Código do Trabalho
RCT- Regulamento do Código do Trabalho
IDICT- Instituto de Desenvolvimento e Inspecção das Condições de Trabalho



1. INTRODUÇÃO:

Este trabalho insere-se como complementar em face das exigências do CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO DO TRABALHO, e como opção foi meu entendimento uma abordagem, com alguns limites, da visão que resulta de uma prática diária inerente à própria profissão – inspectora do trabalho – “O inspector do trabalho desenvolve actividades da maior importância, nomeadamente para a melhoria das condições de segurança, higiene e saúde no trabalho em todos os sectores de actividade, incluindo a administração pública central, regional e local. Neste campo, o inspector do trabalho dispõe de dois instrumentos de intervenção eminentemente preventiva de grande alcance, que lhe permitem determinar ao empregador que proceda às modificações necessárias no local de trabalho para assegurar aos trabalhadores condições de segurança, higiene e saúde, ou que suspenda os trabalhos em curso quando haja riscos graves para a vida, a integridade física ou a saúde dos trabalhadores, ou probabilidade séria da sua verificação. Se as situações de perigo corresponderem a ilícitos penais, nomeadamente o novo tipo de infracção de regras de construção, dano em instalações e perturbação de serviços, o inspector do trabalho deve atender à necessidade de conjugar os seus poderes de intervenção com a colaboração devida ao Ministério Público, de acordo com o direito processual penal” ( Estatuto da Inspecção do Trabalho -Decreto-Lei n.º 102/2000 de 2 de Junho)
A Inspecção-Geral do Trabalho (IGT) tem como missão: promover a melhoria das condições de trabalho, tendo em conta os valores sociais e os contextos sociais, económicos e tecnológicos da sociedade e das empresas, pelo que desenvolve estratégias de actuação que visam em suma a promoção do bem-estar no trabalho.
Cerca de dois terços da nossa vida são passados no nosso local de trabalho, no exercício de uma actividade profissional, pelo que as condições de trabalho e em particular as condições de segurança, higiene e saúde em que ele é prestado têm uma grande importância para o estado de saúde do trabalhador e produzem consequências na sua própria produtividade. Em que medida a IGT prossegue a sua missão face ao Código do Trabalho, é o tema que me proponho desenvolver.


2. ALGUNS CONCEITOS DA SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE

O art.º 272.º do CT, enuncia alguns princípios gerais em matéria de shst, seguindo o exemplo do seu antecessor, o art.º 4.º do Dec. Lei 441/91 de 14/11, que por seu turno já desenvolvia e transpunha os princípios de política nacional de prevenção, estabelecidos na Convenção 155 da OIT(art.º 4.º e seguintes) e no art.º 4.º da Directiva-Quadro(89/391/CEE).
Estes princípios traduzem-se numa nova filosofia de gestão da prevenção dos riscos profissionais nos locais de trabalho, implicando obrigações para o Estado, Empregadores e para os Trabalhadores. Todos têm o seu papel definido na prevenção.
Deste artigo emergem dois conceitos chave em matéria de shst: “prevenção” e “risco profissional”, eles próprios enunciados e desenvolvidos pelo RCT. A prevenção será então a acção de evitar, minimizar ou reduzir os riscos profissionais e deverá ser levada a cabo em todas as fases da vida da empresa, estabelecimento ou serviço (art.º 213.º, n.º1,c) do RCT). A prevenção traduz-se quer em acções/actividades, quer em medidas, ditas , de prevenção.
Quanto ao risco profissional este significa a possibilidade de um trabalhador sofrer um dano na sua saúde ou integridade física provocado pelo trabalho, ou seja uma combinação entre a probabilidade de ocorrência de um fenómeno perigoso com a gravidade das lesões ou danos para a saúde que tal fenómeno possa causar. O art.º 213.º do RCT enuncia depois quais são as actividades de risco elevado, tal como já fazia o art.º 5.º, n.º 4 do Dec.Lei 26/94 de 1/2.Sendo certo que esta noção é relevante porque as empresas ou estabelecimentos que desenvolvam actividades de risco elevado e que tenham expostos a tal risco pelo menos 30[1] trabalhadores, devem ter serviços internos de shst. (art.º 224.º, n.º3 do RCT) No entanto, se compulsarmos o elenco das actividades de risco elevado, desde logo deparamos na alínea a) do n.º 2 do art.º 213.º , com os “trabalhos em obras de construção, escavação, movimentação de terras, túneis, com riscos de quedas de altura ou de soterramento, demolições(...)” ou seja em suma a actividade de construção civil que no nosso país é ainda a actividade profissional com maior índice de sinistralidade mortal e grave. De acordo com o quadro legal que entre nós vigora, qualquer empresa deste ramo, com 30 trabalhadores em actividade em estaleiros de construção civil, terá de organizar serviços internos de shst. No entanto a nossa prática, com visitas inspectivas regulares, neste sector revela uma realidade completamente diferente... As empresas desta dimensão não possuem serviços internos organizados, recorrem apenas a serviços externos, alegando invariavelmente falta de suporte financeiro para tal ou desconhecimento da lei.

3. QUADRO NORMATIVO E REGULAMENTAR

O Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 99/2003 de 27/8 e respectivo Regulamento aprovado pela Lei n.º 35/2004 de 29/7, reservam capítulos para tratamento específico da matéria de Segurança, Higiene e Saúde no trabalho.[2] ( respectivamente Capítulo IV, do livro I, Título II do Código e Capítulo XXII do Regulamento). Salientando-se que tais disposições legais, são aplicáveis, com as necessárias adaptações, ao trabalhador por conta própria. ( artº 212º do RCT)
No entanto, esta matéria é também tratada amiudadas vezes nestes diplomas legais, no desenvolvimento de regimes jurídicos como: protecção da segurança e saúde da trabalhadora grávida, puérpera ou lactante; trabalhador menor; teletrabalhador; trabalhador com deficiência; trabalhador estrangeiro; trabalho nocturno; trabalho por turnos, acidentes de trabalho...
A integração da SHST no Código vem na esteira da Directiva n.º 89/391/CEE de 12 de Junho, que contem as medidas destinadas a promover a melhoria da segurança e saúde dos trabalhadores no trabalho- Directiva Quadro da SHST- transposta para o direito interno português pelo Decreto –Lei n.º 441/91 de 14 de Novembro.
O Código e respectivo Regulamento desenvolvem ainda matérias como: Serviços de segurança, higiene e saúde no trabalho, anteriormente previstos pelo Decreto Lei nº26/94 de 1 de Fevereiro,( que sofreu várias alterações e tendo a última redacção sido dada pela lei 109/2000 de 30 de Junho) , actividades proibidas ou condicionadas que envolvam agentes biológicos, físicos ou químicos, etc.
Pese embora, esta inclusão de matérias de SHST no novo quadro legislativo laboral, muita legislação permanece avulsa dada a complexidade e heterogeneidade de riscos profissionais, actividades industriais, etc. Pense-se por exemplo na legislação( normas jurídicas de conteúdo técnico) sobre: ruído, iluminação, ventilação, ambiente térmico, sinalização de segurança, equipamentos de protecção individual ou sobre actividades industriais com processos produtivos tão diferenciados como: Indústria de madeiras, têxtil, cerâmica, agricultura ou construção civil...


4. O DIREITO À SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE NO TRABALHO

O trabalho é um vector fundamental para o desenvolvimento da sociedade. Hoje é necessário encará-lo não só como uma fonte de recursos ou rendimento, mas sim e também como uma componente de realização integral do homem.
A realização pessoal e profissional no trabalho depende da própria qualidade de vida que se vive no local de trabalho, em particular, da existência de condições de segurança, higiene e saúde no mesmo.
Todos os trabalhadores têm direito a prestar a sua actividade em condições de segurança, higiene e protecção da saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho. Acrescente-se ainda, que no contrato de trabalho, o trabalhador (bem como o empregador) tem direito à sua integridade física e moral.
O direito à integridade física e moral figura na Subsecção II da Secção II- Sujeitos -, do Título II - Contrato de Trabalho- do CT, como um Direito de personalidade (art.º 18.º do CT). Pretende-se assim, proteger ambos os contraentes (mas principalmente o contraente mais débil ou desfavorecido, o trabalhador) de actos vexatórios, hostis, humilhantes ou degradantes da parte do outro contraente, que afectem a sua dignidade e honra enquanto cidadão. Por outro lado visa-se também garantir a tutela das partes contra o assédio moral (art.º 24.º do CT), conhecido como “mobbing”, exercido (sobretudo) sobre o trabalhador, por alguém hierarquicamente superior ou pelo próprio empregador afectando directa ou indirectamente a sua dignidade pessoal.
Refira-se ainda a definição de um princípio geral no capítulo dos direitos de personalidade, onde o art.º 19.º, sob a epígrafe: “Testes e exames médicos”, prevê que o empregador não pode para efeitos de admissão ou permanência no emprego exigir a realização ou apresentação de testes ou exames médicos para comprovação das condições físicas ou psíquicas do trabalhador. Excepcionam-se apenas situações em que esteja em causa a protecção e segurança do trabalhador ou de terceiros ou quando particulares exigências inerentes à actividade o justifiquem. Pense-se por exemplo no trabalhador da indústria alimentar, que está em período de restabelecimento de doença e que por conseguinte deverá submeter-se a exame médico prévio ao seu regresso ao trabalho, para prevenção de qualquer intoxicação alimentar ou inclusivamente prevenir o contágio de outros trabalhadores, defendendo ainda o próprio direito à prestação da actividade em condições de segurança, higiene e saúde dos seus colegas.
Como requisitos formais para que estas excepções funcionem é necessário que o empregador forneça por escrito ao candidato a emprego ou trabalhador a fundamentação que justifica a realização do teste ou exame e que as informações sejam prestadas a médico.
Os direitos de personalidade consagrados no CT viram o respectivo regime jurídico definido no RCT, art.º 27 e seguintes.
Daqui se infere para as entidades empregadoras uma obrigação de aplicarem todas as medidas necessárias para que essa protecção da shst seja efectiva. Trata-se de uma obrigação geral de prevenção da parte do empregador que se traduz numa obrigação de resultado, isto é, a lei fixa os objectivos a atingir, mas a concretização, o modu, como o empregador atinge esse fim é deixado ao seu critério, com alguma extensão. Alguns dos meios de atingir este resultado, estão previstos no Regulamento do Código a partir do art.º 211.º, sendo certo que apesar dessa regulamentação, ainda persistem situações em que a escolha dos meios depende do empregador( p.ex. opção pela modalidade de serviços de shst). Esta escolha não é discricionária, já que a lei define os sistemas e métodos respeitantes aos procedimentos inerentes aos processos de decisão e condução da acção preventiva os quais significam que da sua observância resulta a concretização daquela obrigação de resultado.
Nesta ordem de ideias, esta obrigação geral, não se traduz apenas por um dever geral de abstenção relativamente àqueles direitos fundamentais do trabalhador. O empregador tem a obrigação de pro-activamente adoptar medidas de prevenção da vida, integridade física e mental do trabalhador.
Pelo que se conclui que coexistem com o dever de abstenção, o dever de segurança, higiene e saúde, em suma, o dever de prevenção por parte do empregador.
Este é, simultaneamente, um principio que emerge da Convenção 155 da OIT(ratificada por Portugal pelo Dec. N.º 1/85 de 16/1), da Directiva –Quadro (Directiva 89/391/CEE)[3], de um imperativo constitucional também dirigido aos poderes públicos no sentido de estes fixarem os pressupostos e assegurarem o controlo das condições de higiene e segurança. (art.º 59,n.º1,c) da Lei Fundamental)
A tomada de decisões no plano da sociedade, deve estruturar-se a três níveis diferentes:
- nível político: onde se situa a intervenção do governo que define as estratégias de política nacional, materializadas depois em quadro legal, programas operacionais ou sistemas de incentivo, trazidos para a prática principalmente pela “mão” dos Ministérios da área laboral e da saúde;
- nível institucional: abrange diversas entidades[4] e corpos profissionais (inspectores de trabalho, técnicos de segurança e saúde, médicos do trabalho, psicólogos do trabalho, etc) que vão operacionalizar ou aplicar as decisões políticas, transformando-as em programas e submetendo-as a métodos de trabalho, descendo até á realidade de cada local de trabalho concreto;
- nível das empresas e respectivos locais de trabalho: aqui são abrangidos diferentes destinatários: órgãos decisores da empresa, quadros, encarregados, representantes dos trabalhadores para a segurança e saúde, trabalhadores em geral.

Neste sentido, assegurar este direito aos trabalhadores, é em primeiro lugar tarefa estatal, já que será ele quem determina as orientações políticas a seguir, através não só da criação de legislação na matéria, mas também controlando a efectividade dessa legislação, nomeadamente através da Inspecção Geral do Trabalho.
Este direito foi inicialmente desenvolvido, por aquela que ficou conhecida como a Lei-Quadro em matéria de SHST, o Decreto-Lei n.º 441/91 de 14 de Novembro e hoje figura no art.º 272, n.º1 do Código do Trabalho.
Este direito é complexo e composto por outros direitos:
1. O direito à segurança no trabalho, que compreende o conjunto de metodologias, procedimentos adequados à prevenção de acidentes de trabalho- prevenção de riscos profissionais –tendo como principal campo de acção o reconhecimento e controlo dos riscos associados aos componentes materiais de trabalho[5], como são: os locais de trabalho, os equipamentos, os processos de trabalho, entre outros.
2. O direito à higiene no trabalho que compreende o conjunto de metodologias não médicas necessárias á prevenção de doenças profissionais, visando essencialmente o controlo da exposição aos agentes físicos, químicos e biológicos inerentes aos componentes materiais do trabalho. Tratam-se de medidas e técnicas que actuam principalmente sobre o ambiente de trabalho e que em suma visam a promoção da saúde do trabalhador.
3. O direito à saúde no trabalho compreende não só os actos de vigilância médica, para verificação da ausência de doença ou enfermidade, mas também o controle dos elementos físicos, sociais e mentais que possam afectar a saúde dos trabalhadores, de onde se infere a fulcral importância do médico do trabalho conhecer –directamente- “os bastidores” dos contextos de trabalho, os ambientes de trabalho, numa palavra todos os “componentes materiais do trabalho”.
O conceito de “saúde no trabalho” tem vindo a evoluir, para ser entendido já não como um mero estado de ausência de doença, mas como necessidade de promover um ambiente de bem estar, gerador de factores motivacionais dos colaboradores da empresa. Assim, integram hoje este conceito novas preocupações no âmbito dos factores associados ao ritmo de trabalho e factores psicossociais.
Num contrato de trabalho o trabalhador presta a sua actividade sob autoridade e direcção de um ou uma pluralidade de empregadores.(cfr. art.º 10.º CT) Este poder de direcção enunciado depois no art.º 150.º do CT, significa que o empregador tem o poder de fixar as condições em que o trabalhador deverá prestar a sua actividade de forma a favorecer a compatibilização da vida profissional com a vida familiar do trabalhador, bem como assegurando o respeito das normas aplicáveis em matéria de segurança, higiene e saúde no trabalho. ( art.º 149.ºdo CT)
O núcleo central das obrigações do empregador, em cada local de trabalho reside em:
Ø Assegurar a prevenção relativamente a todos os trabalhadores e a todos os riscos profissionais, isto é, relativamente a todos os eventos da vida real que possam significar factores de agressão para a saúde (maxime doenças profissionais) ou segurança física dos trabalhadores (acidentes de trabalho);(art.º 273.º, n.º1 CT)
Ø Desenvolver as actividades preventivas obedecendo aos princípios gerais de prevenção - art.º 273.º, n.º2 CT (vide nota de rodapé n.º 6);
Ø Avaliar os riscos que não puderam ser eliminados;
Ø Organizar os meios adequados à implementação das medidas de prevenção e protecção, de entre os quais se destacam os serviços de segurança, higiene e saúde do trabalho ;(art.º 276 CT e art.º s 212.º, 213.º, 218.º a 263.º do RCT)
Ø Promover um quadro de informação, consulta e participação - directa ou representativa- na empresa potenciador da acção preventiva;(art.º 275.º e 277.º CT e art.º s 253.º,254.º e 264.º e seguintes do RCT)
Ø Tomar as medidas necessárias para ocorrer a situações de emergência ( primeiros socorros, luta contra incêndios, evacuação de trabalhadores, situações de perigo grave e imediato), compreendendo o estabelecimento de contactos com entidades externas com responsabilidades nos naqueles domínios, p.ex: Bombeiros.(art.º 273.º,n.º2, i) e art.º 220.ºRCT)
Ø Desenvolver a cooperação e coordenação com outros empregadores sempre que desenvolvam actividades com os respectivos trabalhadores no mesmo local de trabalho (art.º 273.º, n.º 4 do CT).

Desta forma tenderá a garantir ao trabalhador estes direitos em matéria de SHST.

Hoje em dia, a realidade de trabalho nas empresas e riscos profissionais que lhe são próprios apresentam-se com um grau de exigência e complexidade crescentes.
O mundo do trabalho integra e interage , cada vez mais, com vários contextos (tecnológicos, científicos, ambientais, regras de mercado – nacionais e internacionais, etc.) que se pautam por determinados quadros legais, contextos estes que condicionam (positiva ou negativamente) os próprios riscos profissionais nos locais de trabalho e a eficácia da acção preventiva que aí se desenvolva.

Numa óptica de gestão da segurança e saúde no trabalho, a política de prevenção figura lado a lado, com a política de qualidade, de ambiente, etc., como parte integrante de toda a filosofia de gestão da empresa.

Nestes termos, o empregador deverá organizar as actividades de SHST que visem a prevenção de riscos profissionais e a promoção da saúde do trabalhador, tendo por base os princípios gerais estruturantes da filosofia da prevenção de riscos profissionais, hoje previstos no art.º 273.º, n.º2 do Código Trabalho. [6]

Refira-se que as actividades de SHST deverão ser desenvolvidas em todas as fases de actividade da empresa (art.º 213.º, n.º 1,c) do RCT) isto é, por exemplo, desde o momento em que é admitido um novo trabalhador em que, o empregador o tem de submeter a um exame médico para aferir da sua capacidade física para o desempenho das suas funções, passando pela alteração de um processo de fabrico que implica a introdução de uma máquina nova e que seja ministrada formação sobretudo no domínio da segurança no trabalho com a mesma, até situações que implicam avaliações de riscos permanentes dada a multiplicidade de riscos existentes nas diferentes fases em que se encontrem os trabalhos, como na actividade de construção civil.
Por outro lado, as actividades de SHST, têm de ser desenvolvidas pelo empregador simultaneamente, em todos os locais de trabalho[7] que possua.

Ainda se acrescente que deverão abranger portanto todos os componentes materiais do trabalho e todos os trabalhadores: ( independentemente do seu vínculo à empresa) permanentes, contratados a termo, trabalhadores temporários incluindo trabalhadores que prestam serviços ocasionais de manutenção, reparações, etc., pertencentes a outras entidades empregadoras, não excluindo as responsabilidades na matéria destas últimas e o dever de cooperação que paira entre todas quando os respectivos trabalhadores desenvolvem a sua actividade no mesmo local de trabalho.( vide art.º 273.º, n.º 4 do CT)

A falta culposa de condições de shst constitui nos termos do art.º 441.º, n.º2, d) do CT, justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador.

As medidas e actividades relativas à shst no trabalho não podem implicar encargos financeiros para os trabalhadores.(art.º 274, n.º4 do CT e art.º 261 do RCT). Não sendo, legítimo exigir ao trabalhador que suporte o encargo com o seu equipamento de protecção individual (como p.ex. botas de palmilha e biqueira de aço ou capacete) essenciais ao exercício em segurança da sua actividade.

Por outro lado, pensamos que não será igualmente legítimo exigir que o trabalhador se submeta a exames de saúde fora do período normal de trabalho nem a suas expensas. A realização dos exames de saúde aos trabalhadores trata-se de uma obrigação do empregador para aferir da aptidão/ capacidade física e psíquica do trabalhador para o exercício da sua actividade, inscrita na sua obrigação geral de assegurar condições de shst no trabalho, nomeadamente promovendo a vigilância da saúde dos trabalhadores.
O período normal de trabalho é o tempo durante o qual aquele desempenha a sua actividade, actividade esta cujo exercício em condições de segurança e saúde compete ao empregador zelar . Como tal não deverá ser exercida ( esta obrigação) fora do horário de trabalho, isto é dentro do período de auto-disponibilidade do trabalhador. Igual fundamentação sustenta a gratuitidade, para o trabalhador, dos mesmos.
Nestes termos, a entidade empregadora deve determinar a data e hora de realização dos exames de saúde, cabendo ao trabalhador, a obrigação de comparência no momento determinado para a sua execução, no âmbito de um dever de colaboração ou cooperação com o empregador, abordado no ponto seguinte.
No entanto em circunstâncias excepcionais, p.ex. ligadas à implantação de novos processos produtivos ou outros casos em que os meios utilizados no desenvolvimento da actividade pressuponham um acréscimo de riscos profissionais e concomitantemente se verifique uma urgência de controlo da saúde dos trabalhadores, que não se compadeça com uma marcação temporalmente distante dos referidos exames, poderá ser exigível a sua realização imediata fora do período normal de trabalho.

Finalmente refira-se que constituem ainda direitos dos trabalhadores em matéria de SHST:
Ø Fazer propostas na área de saúde e segurança no trabalho; (art.º 274.º,n.º1, d) e art.º 275.º, n.º4 do CT)
Ø Dirigir observações ou solicitar a intervenção da Inspecção Geral Trabalho ou outra autoridade competente (p.ex: Inspecção das Actividades Económicas, Direcção Geral de Saúde, etc) durante as respectivas visitas ou fora delas(art.º 279.º,n.º4 do CT e art.º 469.º, n.º 7 do RCT);
Ø Cessar a prestação da sua actividade em caso de perigo grave e iminente que não possa ser evitado, no quadro das medidas e instruções transmitidas pelo empregador.(art.º 273,n.º2, l) do CT)

5. O DEVER DE SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE NO TRABALHO

A relação laboral tem um carácter sinalagmático, pelo que implica para ambas as partes deveres recíprocos.
O direito à SHST é também um dever do trabalhador, ele não é o objecto da prevenção, mas sim um “actor” da prevenção, cabendo-lhe um envolvimento a nível de informação, formação, consulta e cooperação em diversos domínios das actividades preventivas.
Cabem ao trabalhador determinadas obrigações, hoje elencadas no art.º 274.º do CT, de que se destacam:

Ø Cumprir as prescrições legais, contidas em IRCT ou instruções emanadas do empregador em matéria de shst;
Ø Zelar pela sua segurança e saúde, bem como pela de outrem que possa ser afectado pelas suas acções ou omissões no trabalho;
Ø Utilizar correctamente os meios que lhe são colocados à disposição na empresa;
Ø Comunicar situações de perigo grave e iminente;
Ø Adoptar as medidas estabelecidas para os casos de perigo grave e iminente;
Ø Colaborar com o empregador, os profissionais da prevenção e as autoridades públicas na melhoria das condições de segurança e saúde nos locais de trabalho;
Ø Tomar conhecimento da informação e participar na formação sobre segurança e saúde do trabalho;
Ø Comparecer aos exames de saúde tidos como necessários, adequados e proporcionados ao exercício da actividade profissional em condições de SHST.

Os deveres dos trabalhadores nesta matéria figuram ainda no RCT, art.º 255.º, n.º1, sob a forma de um dever geral de cooperação, fazendo o corpo do artigo referência especial a dois dos deveres que daquele emergem:
- dever de tomar conhecimento da informação nesta matéria prestada pelo empregador, a que nós acrescentaríamos ou por representante do empregador para shst, superior hierárquico; técnico prestador dos serviços ou autoridade pública na matéria (p.ex. IGT);
- dever de comparência às consultas e exames médicos determinados pelo médico do trabalho e comunicados por norma pela entidade empregadora.

O artigo em análise (no n.º2) estende o âmbito do dever de cooperação aos trabalhadores com funções de direcção e quadros técnicos, cooperação esta com os serviços de shst. Trata-se de uma reminiscência da ideia de pensar prevenção “a montante” de uma forma integrada nas próprias funções de gestão.

O dever de colaboração nas actividades de shst assume vasta amplitude. O trabalhador tanto deverá p.ex. seguir as instruções do seu empregador em matéria de procedimentos de segurança a adoptar quando operar com a máquina “x”, como tem o dever de comparecer na data e hora designada para se submeter a testes audiometricos, recomendados pelo médico do trabalho.

A inobservância dos deveres do trabalhador é susceptível de acção disciplinar (art.º 396, n.º 3, h) do CT) e poderá ter implicações a nível de descaracterização dos acidentes de trabalho.(art.º 290.º, n.º1 a) do CT).

Por último, refere o Código(art.º 274.º, n.º 5) que as obrigações em matéria de shst dos trabalhadores não excluem a responsabilidade do próprio empregador, isto é, a shst é uma obrigação “primária” do empregador, omnipresente na vida da empresa.
Pese embora o trabalhador tenha um papel activo, como acima se viu, o nosso sistema jurídico, continua nesta matéria a proteger o “contratante mais débil”, o que na nossa óptica se compreende, sobretudo quando se constata uma certa ausência de cultura da prevenção no nosso país.
A solução contrária traria repercussões graves sobretudo quando a falta de condições de shst está na origem de acidentes de trabalho. Esta situação é notória, p.ex. em Relatórios de Inquéritos de acidente de trabalho, nos quais a IGT conclui frequentemente que o sinistro se ficou a dever à falta de colocação de protecção colectiva num andaime utilizado pelos trabalhadores para efectuarem o reboco exterior de um edifico. Nestas situações seria fácil para o empregador, transferir a responsabilidade para o trabalhador, que não colocou as protecções em falta! ( Ou não fosse ele próprio que não as comprara! Ou lhe dissera para não as colocar para não perder tempo, etc,etc.)
Sobre a responsabilidade do trabalhador em caso de violação de dever de zelo pela segurança e saúde vide ainda ponto 6.5. deste trabalho.

6. O PAPEL DA IGT NA SEGURANÇA, HIGIENE E SAÚDE NO TRABALHO


6.1. Enquadramento normativo e regulamentar

A Inspecção-Geral do Trabalho é um serviço público tutelado pelo membro do Governo responsável pela área laboral, com autonomia técnica, segundo os princípios previstos nas Convenções 81, 129 e 155 da OIT, sendo dirigida por uma autoridade central (Inspector-Geral do Trabalho e dois Subinspectores-Gerais) de acordo com o respectivo Estatuto (Dec.Lei n.º 102/2000 de 2 de Junho).
Os princípios essenciais da organização e actividade do sistema de inspecção do trabalho estão consagrados em instrumentos normativos da OIT ratificados por Portugal, concretamente a Convenção n.º 81 de 1947, sobre a inspecção do trabalho na indústria e comércio, a Convenção n.º 129 de 1969, sobre a inspecção do trabalho na agricultura e a Convenção n.º 155, sobre a segurança e a saúde dos trabalhadores. Esta última Convenção n.º 155 de 1981, estabelece os princípios de política nacional para a prevenção de riscos profissionais nos locais de trabalho, os quais configuram as obrigações fundamentais para o Estado, Empregadores e Trabalhadores. Entre as obrigações do Estado figura a de assegurar um sistema de inspecção apropriado e suficiente neste domínio.
A IGT portuguesa é uma inspecção que segue o modelo “generalista”, ocupando-se simultaneamente, das condições gerais de trabalho e das condições de segurança e saúde no local de trabalho,(art.º 1.º e 3.º n.º 1 a) do Estatuto) abrange todos os sectores de actividade onde se verifique ou possa verificar, a prestação de trabalho. Recorda-se aqui o art.º2.º, n.º1 do respectivo Estatuto: “...exerce a sua acção no continente, em empresas, qualquer que seja a sua forma ou natureza jurídica, de todos os sectores de actividade, seja qual for o regime aplicável aos respectivos trabalhadores, bem como quaisquer locais em que se verifica a prestação de trabalho ou em relação aos quais haja indícios fundamentados dessa prestação.” E acrescenta-se (n.º2) que quanto aos serviços e organismos da administração pública central e local, incluindo os institutos públicos, “a IGT é competente para promover e controlar o cumprimento da legislação relativa à segurança, higiene e saúde no trabalho”. Seguem este modelo países como: França, Espanha e Itália.
Contrariamente a este modelo, a inspecção “especialista” caracteriza-se por se consagrar quase exclusivamente ao domínio da segurança e saúde no trabalho. É o modelo que vigora em países como p.ex.: Alemanha, Inglaterra e Dinamarca.

6.2. O sistema de inspecção e os limites da sua acção

De acordo com o n.º 1 do art.º 279.º do CT e art.º 469.º, n.º s 2 a 7 do RCT, compete à IGT a fiscalização do cumprimento da legislação relativa a shst, bem como a aplicação das respectivas sanções.(sem prejuízo da competência atribuída a outras entidades). Fiscalizar significa não só e apenas examinar, vigiar, inspeccionar ou sindicar. A “fiscalização” da IGT é, como veremos, mais abrangente.
A natureza da intervenção da IGT em matéria de shst ( como noutras matérias) poderá classificar-se como:
- eminentemente preventiva: a actuação da IGT visa em última análise a prevenção dos acidentes de trabalho;
- pedagógica: a IGT presta informações e conselhos;
- abrangente e pluridisciplinar: a shst implica uma avaliação de todos os riscos que “coabitam” no local de trabalho, estando em causa, regras técnicas sobre matérias diversificadas que vão desde a electricidade, até ao ruído, passando por riscos químicos, biológicos, etc. O processo de licenciamento industrial[8], exige, na grande maioria dos casos a emissão de parecer favorável da IGT e de outras entidades( como a Saúde, o Ambiente, etc), e a IGT é igualmente chamada a participar nas vistorias[9] com vista à concessão de licença de laboração, de forma a que “a montante”, quer na fase de projecto( de “papel”), quer na fase de instalação a prevenção seja desde logo integrada, cabendo aqui à IGT, zelar pela shst dos trabalhadores que irão ocupar aqueles postos de trabalho;
- integrada e estruturante: a perspectiva a adoptar pela IGT, perante as questões de shst deverá considerar os princípios de prevenção atrás enunciados, adaptando-os à dimensão da empresa, à sua organização, às possibilidades que a técnica oferece, etc. Por outro lado, a intervenção da IGT na empresa deverá ser eficaz, evitando se possível novas não conformidades em shst. Pretende-se portanto uma actuação a nível da própria gestão empresarial.

A acção da IGT visa a protecção de valores fundamentais como: a vida, integridade física e mental e a saúde dos trabalhadores. A IGT, é um agente regulador das disfunções entre o económico e os social, contribuindo para o progresso social e para o incremento da cultura de prevenção no seio das empresas. Esta acção desenvolve-se numa dupla vertente: acção de conselho e de controlo.
No primeiro dos casos, a IGT, presta informações a empregadores, trabalhadores, técnicos de SHST, etc, quer na própria Instituição- através do recurso por aqueles ao serviço informativo(presencial ou telefónico)-, quer nos locais de trabalho, quer por informação escrita. Por outro lado, a IGT também emite orientações: orais ou escritas, como p.ex. uma recomendação escrita.
A acção da IGT assume ainda uma natureza reactiva p.ex. através de um pedido de intervenção de um trabalhador (art.º 279.º, n.º4 do Código), de uma trabalhadora grávida que opera com equipamentos para efectuar radiografias e que durante a gravidez não deverá estar exposta a tais radiações ( art.º 469.º,n.º7 do RCT e art.º 49.º do CT) - pedido este que reveste carácter prioritário e urgente para a IGT-, de um sindicato ou por iniciativa própria em obediência às orientações internas emergentes do cumprimento do próprio Plano Nacional/ Regional de Actividades.
Quanto à acção de controlo, a IGT, nesta matéria, pode promover, “fazer fazer”- no sentido de fazer com que outrem faça- a realização de “ Relatórios de avaliações de riscos”, prescrever medidas de prevenção,[10] ( p.ex. através de uma Notificação para dotar de protecção colectiva uma serra de fita); prescrever medidas imediatamente executórias[11]: Notificação para Suspensão imediata dos trabalhos que estão a ser desenvolvidos por colocarem em risco de vida os trabalhadores.
Cabem ainda dentro desta acção: a participação[12] a outras entidades, como p.ex.: Participação às Autoridades de saúde locais, da falta de condições de higiene de um estabelecimento de fabrico de pastelaria; Participação ao Ministério Público de desobediência a uma ordem de suspensão de trabalhos emanada pela IGT por risco grave e iminente para a vida dos trabalhadores.

6.3. Algumas especificidades da sua actuação – os acidentes de trabalho

Compete ainda à IGT a realização de Inquéritos de Acidente de Trabalho[13], nos casos previstos no art.º 279.º, n.º 2, do CT isto é, em caso de morte ou que evidencie uma situação particularmente grave. Trata-se de uma disposição anteriormente contida no art.º 21.º, n.º2 do D.L 441/91.[14] E já no domínio da lei anterior o empregador tinha a obrigação de comunicação à IGT(territorialmente competente) de acidentes de trabalho mortais ou que evidenciem uma situação particularmente grave (art.º14.º do mesmo diploma, hoje art.º 257.º do RCT).
Esta comunicação deverá ser efectuada no prazo máximo de 24 horas seguintes à ocorrência, e ser acompanhada de informação e registo dos tempos de trabalho ( nos termos do art.º 162.º do CT )prestados pelo trabalhador sinistrado nos 30 dias que antecederam o acidente.( art.º 257.º, n.º s 1 e 2 do RCT)
Identificar e analisar as causas dos acidentes de trabalho, é uma tarefa importante que a IGT leva a cabo, para poder circunscrever ou eliminar os factores que estiveram na sua origem e a partir daí desenvolver uma estratégia de intervenção para implementar as metodologias adequadas à acção preventiva. Realizar um inquérito de acidente de trabalho, significa portanto determinar, do ponto de vista da segurança do trabalho quais as circunstâncias que o originaram, que medidas preventivas deveriam ou poderiam ser utilizadas e que não o foram, tudo isto tendo em conta o quadro organizacional que constitui a empresa e o universo de trabalhadores ali em funções.
Esta avaliação/análise cabe à IGT, no âmbito das suas competências de promoção do cumprimento da legislação de shst. A IGT visa em suma, a prevenção, na acepção do art.º 213.º, n.º1,c) do RCT.

O art.º 14.º da Convenção n.º 81 da OIT, normativo ratificado por Portugal, visando proporcionar à IGT um sistema de informação, que lhe permita agir tempestivamente, prevê a existência de um sistema de inspecção de trabalho que permita assegurar a aplicação das disposições legais relativas às condições de trabalho e à protecção dos trabalhadores no exercício da sua profissão tais como as disposições relativas à duração do trabalho, salários, segurança, higiene, bem-estar, emprego de menores e outras matérias conexas. Nestes termos a oportunidade, o momento do exercício da acção inspectiva, no que à realização de inquéritos de acidente de trabalho concerne é algo que deverá ser assegurado pelo nosso quadro normativo.
A questão que aqui se coloca é: quais são os acidentes de trabalho que evidenciam uma situação particularmente grave? Como integrar este conceito?
Alguma jurisprudência tem integrado este conceito, apenas com base nas consequências do acidente, isto é nos danos ou lesões corporais “tout court”, “desprezando” a origem desses mesmos danos, as causas do próprio acidente.
Cremos, no entanto, salvo melhor opinião, que a prevenção deverá ser pensada a montante, isto é, só analisando o circunstancialismo sob o ponto de vista da segurança e saúde no trabalho, isto é, desde a análise de risco até às medidas de prevenção que in casu deveriam de ser adoptadas é que poderemos, verdadeiramente prevenir. Até porque há acidentes que ocorrem em situações de verdadeira ausência de condições mínimas de segurança e dos quais (felizmente!) não resultam quaisquer danos físicos para os trabalhadores.[15]

A situação “particularmente grave” terá de ser, quanto a nós perspectivada sob duas formas:
1- quanto ao tipo de lesão e teremos como lesão grave a materialização do dano que o acontecimento provoca, tendo como consequência a incapacidade para o trabalho por um período previsivelmente alargado e que se possa antever no momento do acidente;(p.ex. corte e decepamento de dedos numa máquina)
2- quanto às condições de segurança no trabalho, independentemente da própria graduação dos danos, já que poderão ou não resultar danos corporais relevantes, mas o que está verdadeiramente em causa é a ausência total ou parcial de condições de segurança no trabalho, a falta de avaliação e controlo dos riscos em presença.(p.ex. queda de 4 metros de altura de um andaime, sem protecção colectiva, sem danos corporais graves para o trabalhador.)

Nestes termos, deverão ser comunicados à IGT ,no mais curto espaço temporal possível (maxime nas 24h seguintes) todos os acidentes de trabalho naquelas condições, sob pena de se perderem ou dissiparem vestígios do acidente e de todo o circunstancialismo em que terá ocorrido, com prejuízo da acção inspectiva/preventiva subsequente.
São vários os diplomas legais que em diferentes áreas de actividade estabelecem a obrigatoriedade de comunicação dos Acidentes de Trabalho à Inspecção Geral Trabalho e outras entidades, sendo certo que em alguns casos o legislador sublinhou a importância da “dupla perspectiva”- tipo de lesão e condições de segurança- que acima descrevemos.
No sector de actividade económica com maior índice de sinistralidade laboral, a construção civil, o Dec. Lei n.º 273/2003 de 29 /10[16], actual regime jurídico, relativo às prescrições mínimas de segurança e saúde no trabalho a aplicar em estaleiros temporários ou móveis, prevê no respectivo art.º 24.º a necessidade de comunicação de acidente de trabalho de que resulte a morte ou lesão grave do trabalhador, ou que assuma particular gravidade na perspectiva da segurança do trabalho.
O Regulamento Geral de Segurança e Higiene no Trabalho nas Minas e Pedreiras, aprovado pelo Dec. Lei n.º 162/90 de 22/5, contem nesta matéria, duas disposições (art.ºs 170.º e 172.º) onde se prevê a necessidade de comunicação de: acidentes pessoais, isto é, aqueles dos quais resultaram mortos ou feridos graves e acidentes materiais, isto é, aqueles em que, independentemente da existência também de acidentes pessoais tenha ocorrido p.ex. um abatimento descontrolado, uma rotura de extracção, etc.
O Dec.Lei n.º 324/95 de 29/11 que transpõe as Directivas comunitárias: 92/917CEE de 3/11 e 92/104/CEE de 3/12 em matéria de prescrições mínimas de saúde e segurança a aplicar nas indústrias extractivas por perfuração a céu aberto ou subterrâneas, prevê a necessidade de comunicação dos acidentes dos quais resulte a morte, lesão grave ou que independentemente da produção de danos pessoais, evidenciem uma situação particularmente grave para a segurança ou a saúde dos trabalhadores.(art.º 9.º)
O Regime jurídico da pesquisa e exploração de massas minerais-pedreiras, previsto no Dec. Lei n.º 270/2001 de 6/10 , na mesma perspectiva, no preceituado pelo respectivo art.º 58.º, refere a necessidade de comunicação de qualquer acidente do qual resulte morte, ferimentos graves ou danos materiais vultuosos.
O Dec. Lei n.º 116/97 de 12/5, diploma que estabelece as prescrições mínimas de segurança e saúde no trabalho a bordo dos navios de pesca, prevê igualmente no respectivo art.º 8.º, a necessidade de comunicação de acidentes de trabalho de que resulte a morte ou lesão de trabalhadores ou que, independentemente da produção de danos pessoais, evidenciem uma situação particularmente grave para a segurança e saúde dos trabalhadores.
Por último, permito-me aqui fazer um brevíssimo paralelismo com o Direito espanhol para dizer que de acordo com a “Ley de prevención de riesgos laborales”- lei 31/1995 de 8/11, alterada pela lei 54/2003, no art.º 9.º, sob epígrafe: “Inspecção de trabalho e segurança social”, refere-se que cabe a esta a função de vigilância e controlo das normas sobre prevenção de riscos laborais, tendo neste âmbito, entre outras funções a de informar sobre os Acidentes de Trabalho mortais, muito graves e sobre aqueles em que por suas características ou pelos sujeitos afectados se considere necessária tal informação, assim como sobre as doenças profissionais.(...)
Por outro lado, estabelece-se ainda na referida normativa (art.º 23.º-Documentação) a obrigação do empregador elaborar:
a) relação de acidentes de trabalho e doenças profissionais que tenham causado ao trabalhador uma incapacidade laboral superior a 1 dia de trabalho, sendo certo que além de elaborar esta relação o empresário notificará a autoridade laboral nos termos que aqui se referem em b);
b) notificação por escrito à autoridade laboral dos danos para a saúde dos trabalhadores ao seu serviço que se tenham verificado por causa do exercício/desenvolvimento da sua actividade conforme o procedimento definido regulamentarmente.
Parece-nos, salvo melhor opinião, que nesta matéria o legislador espanhol foi mais cauteloso que o português determinando a necessidade de comunicação de acidentes de trabalho, tendo em conta vários factores: gravidade das lesões, características ou circunstâncias em que as mesmas ocorreram e sujeitos afectados. Mas, ainda se prevê que seja elaborada a relação de acidentes de trabalho que causem uma incapacidade superior a 1 dia de trabalho.
Ora o legislador português, no RCT, art.º 240.º, n.º 3, c) ao elencar os documentos que os serviços de SHST têm de manter actualizados refere: relatórios sobre Acidentes de trabalho que tenham ocasionado ausência por incapacidade para o trabalho superior a 3 dias. Logo é patente a diferença de tratamento da matéria em termos de direito comparado. Atrever-nos-íamos a dizer que nesta como em tantas outras matérias de direito laboral, se o grau de exigência não for grande, se a SHST não deixar de ser encarada pelos empregadores como um custo, para passar a ser tratada como um investimento, as consequências irão traduzir-se invariavelmente em danos na saúde e segurança dos trabalhadores.

6.4. Actuação em relação às empresas prestadoras de serviços de higiene e segurança no trabalho[17]
Uma outra vertente da acção da Inspecção Geral do Trabalho prende-se com o seu papel no sistema de acreditação (autorização de funcionamento) das empresas prestadoras de serviços de shst. Nos termos do art.º 230.º(e seguintes) do RCT os serviços externos de shst carecem de autorização para o exercício da respectiva actividade, a qual depende da satisfação de determinado elenco de requisitos em termos de recursos humanos e técnico profissionais, bem como estruturais, equipamentos, procedimentais e metodológicos. Sendo certo que a direcção da instrução do procedimento de autorização compete ao organismo do Ministério responsável pela área laboral competente em matéria de segurança, higiene e saúde no trabalho,(art.º232.º,nº1 do RCT), à IGT compete participar na vistoria conjuntamente com outras entidades, no âmbito das respectivas competências, avaliando apenas as instalações( art.º 232.º, n.º6, alínea a) do RCT que coincide com a letra do art.º 13.º, n.º3 a) do Dec. Lei 26/94 acima referido) sob a perspectiva de condições de segurança, higiene e saúde no trabalho.
De salientar que no âmbito do art.º 12.º do Decreto-lei 26/94 de 1/ 2[18], a Portaria n.º 467/2002 de 23/4, já estabelecia os parâmetros a ter em conta na decisão de autorização de serviços externos. Nos termos do art.º 252.º[19], n.º2, a) e c) do RCT a IGT participa também nas auditorias a levar a cabo quanto a serviços externos autorizados.
A natureza do bem jurídico em causa: a segurança e saúde dos trabalhadores, supõe uma tutela pública que tenha em conta a sua garantia constitucional (art.º 59.º, n.º1 da Lei Fundamental). A própria Directiva-Quadro (art.º7.º, n.º s 5 e 8)[20] previa que os Estados membros definissem as capacidades e aptidões necessárias, bem como os meios pessoais e profissionais para o funcionamento dos serviços externos de shst.
O processo de acreditação destes serviços passaria por uma fase de instrução ( apresentação de requerimento e outros elementos); fase de apreciação (com consulta a outros organismos e actos de verificação ), fase de decisão e emissão de licença de funcionamento dos serviços. Por fim acresceria uma fase de acompanhamento para aferir da manutenção dos requisitos de permanência na actividade de prestador de serviços de shst. Todo o processo decorria sob a direcção do IDICT.
No entanto o preceito legal em causa previa de uma forma pouco desenvolvida e especificada os procedimentos para autorização de funcionamento dos serviços externos de shst. Facto este agravado por ao tempo não existirem recursos humanos em Portugal, tecnicamente habilitados e certificados ( também pelo IDICT) para o exercício da actividade de shst, nos termos legais.
Podemos então concluir que o procedimento actualmente previsto no RCT(art.º 230.º e seguintes) conduzirá de certo à acreditação de ( pelo menos) alguns serviços de shst que há tantos anos laboram no nosso mercado.
No entanto e pese embora, actualmente o RCT não referenciar expressamente que a não participação da IGT na vistoria no tocante a outros aspectos da vistoria como sejam: equipamentos de trabalho, utensílios, equipamentos de protecção individual, etc (art.º 232.º, n.º6, c) do RCT), aspectos estes que ficarão de futuro a cargo do Instituto (Instituto de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho) que substituirá o IDICT (como acontecia no art.º 13.º, n.º 3 c) do Dec. Lei n.º 26/94) hoje, como ontem, a IGT mantêm a sua competência de controlo permanente das actividades dos serviços de Prevenção de Riscos Profissionais em todos os locais de trabalho, no âmbito das suas competências, ínsitas no quadro legal nacional e internacional, já referido.
Assim, e no tocante ao funcionamento dos serviços de shst nos locais de trabalho que visita a IGT afere, nomeadamente:
Ø se a organização de meios é ou não adequada às finalidades assinaladas pela lei ao empregador (art.º 273.º do CT);
Ø se a referida organização contempla todas as abordagens nucleares que são: a segurança, a higiene e a saúde no trabalho;
Ø se os serviços de shst desempenham a sua actividade regularmente cumprindo integralmente as funções que legalmente lhe cabem,(p.ex. se efectuaram Relatório de avaliação de riscos e preconizaram Medidas de prevenção).
Independentemente da modalidade de serviço de shst adoptada pela empresa, toda a entidade empregadora deverá desenvolver um sistema próprio de gestão de shst que lhe permita gerir e coordenar os recursos da empresa (recursos humanos sistema de informação e formação, etc) e dos serviços externos.
Hoje em dia a nossa, (ainda parca) experiência na actividade inspectiva e em especial nestas matérias, tem revelado que para muitos empresários portugueses o facto de optarem por contratar a prestação de um serviço externo de shst é sinónimo de cumprimento total da lei e consequentemente de isenção de responsabilidades na matéria.
Faço aqui porém um parêntesis para dizer que também muitas são as queixas de empregadores que celebraram contratos de prestação de serviços com serviços externos de shst, pagaram na data de celebração do contrato uma quantia e a partir daí nunca mais foram contactados pela empresa, nunca foram visitados para avaliação da saúde dos trabalhadores, nunca foi realizada uma avaliação de riscos na sua empresa...
Cabe aqui mais uma vez à IGT o papel de pro-activamente, “fazer com que os outros façam”, accionar o sistema de prevenção de riscos profissionais português, esclarecendo, informando os empregadores dos direitos que lhe assistem na matéria, nomeadamente esclarecendo em que se traduz o âmbito da prestação dos serviços que contratou.

6.5. O exercício da função sancionatória e as formas de actuação do inspector do trabalho

A matéria de shst é vasta e está distribuída quer por normas que contêm princípios gerais (essencialmente contidas no CT, art.º272.º e seguintes) , quer por normas regulamentares inscritas no RCT (art.º 211.º e seguintes) quer ainda por muita legislação avulsa “oriunda” na maior parte dos casos de Directivas comunitárias.
Aqui reside um “universo” que a acção inspectiva visa assegurar o respectivo cumprimento, em ordem a garantir que o trabalhador preste a sua actividade em condições de segurança, higiene e saúde no trabalho. Também aqui várias são as formas de actuação possível, sendo em “ultima ratio” o Auto de Noticia uma delas.
Assim, a IGT pode elaborar Notificações para Tomada de Medidas[21] em shst, identificando a situação de risco encontrada, prescrevendo a medida de prevenção e concedendo um prazo para o efeito. Trata-se de um procedimento de cariz eminentemente pedagógico-educativo, de prevenção para futuras situações, que na grande maioria dos casos é cumprido voluntariamente, culminando , portanto com a prestação da actividade do trabalhador de uma forma segura. p.ex. numa visita inspectiva foi detectada uma máquina de corte sem qualquer elemento de protecção que impeça o acesso das mãos do operador à lamina da mesma.
O Direito Espanhol (lei acima referida, art.º 43.º) consagra idêntico procedimento a que a Inspecção de trabalho recorre nas mesmas circunstâncias.
Um outro instrumento que a IGT dispõe, pese embora não seja muito utilizado, particularmente no tocante às matérias de shst, é o Auto de Advertência[22], aplicável quando estejamos perante uma irregularidade sanável e da qual não tenha ainda resultado prejuízo para o trabalhador, a administração do trabalho ou a segurança social.
Trata-se de uma faculdade do Inspector que ajuizará da oportunidade do seu uso face aos objectivos da intervenção. Neste tipo de procedimento a IGT descreve a infracção verificada, indica as medidas para correcção da situação, estabelece prazo para respectivo cumprimento, com a advertência de que o incumprimento das medidas determinará a instauração de processo contra-ordenacional e influenciará no montante da coima.
Como já se referiu não é um instrumento muito utilizado em matéria de shst por não ser adequado a proteger os bens jurídico-fundamentais em causa: a vida e integridade física do trabalhador. Na verdade qualquer infracção neste campo produz repercussões ou prejuízos naqueles níveis e não propriamente para a administração do trabalho ou segurança social, são sempre prejuízos directos ou indirectos para o trabalhador como ser humano, pelo que não nos parece adequado o recurso a este instrumento inspectivo.
Um dos instrumentos mais eficazes na acção inspectiva no âmbito da segurança e saúde(e muitas vezes da própria vida) dos trabalhadores é a Notificação para Suspensão Imediata de Trabalhos[23], instrumento este muito utilizado em situações de risco na actividade de construção civil. Com ele consegue-se afastar imediatamente os trabalhadores de uma situação de risco. É igualmente um instrumento de cariz eminentemente preventivo e pedagógico a utilizar pela IGT em situações de:
1. risco grave, isto é situações em que há no preciso momento da visita inspectiva trabalhadores em situação de risco de vida ou lesão na sua integridade física p.ex são identificados trabalhadores a uma altura de 12 metros, colocando um telhado num edifício sem qualquer protecção colectiva ou individual.
2. ou em situações de probabilidade séria ( isto é risco potencial) de lesão da vida, integridade física ou saúde dos trabalhadores. Neste último caso o risco ainda não é efectivo, ainda não há trabalhadores sujeitos ao risco, mas pelo tipo de trabalhos em desenvolvimento ou a desenvolver certamente irão estar trabalhadores em risco. p.ex. no momento da visita inspectiva não foram identificados trabalhadores utilizando os andaimes(sem protecção colectiva) montados no estaleiro, mas sobre os mesmos existiam baldes de massa fresca e o reboco da parede estava a meio.
Quer num caso, quer no outro a IGT pode determinar a suspensão dos trabalhos.[24]
Idêntico instrumento está consagrado na “Ley de prevención de riesgos laborales” espanhola que atras citei, no art.º 44.º podendo o Inspector de trabalho ordenar a paralisação imediata de trabalhos ou tarefas que impliquem risco grave e iminente para a segurança e saúde dos trabalhadores.
Por outro lado, a IGT no âmbito do seu dever de colaboração com outras entidades com competência na matéria de shst, participa situações que constatou nas suas visitas, pex. Participação à Autoridade de saúde local, do funcionamento de uma indústria alimentar sem condições de higiene, pondo em causa a própria saúde pública.
Finalmente o sancionamento[25] de comportamentos ilícitos em shst, através do levantamento de Auto de Noticia por desrespeito do ordenamento jurídico nesta matéria.( art.º 279.º, n.º1 CT). A “punição” dos infractores não é um objectivo mas sim um meio indispensável para assegurar o cumprimento das normas e promover a melhoria das condições de trabalho. À IGT compete fiscalizar o cumprimento da legislação relativa a shst, bem como aplicar as respectivas sanções. ( art.º 279.º do CT)
Nos termos do art.º 630.º, n.º1 do CT, art.º 469.º, n.º 2 do RCT e art.º s 10.º,11.º e 12.º do Estatuto da IGT, o procedimento das contra-ordenações laborais compete à IGT, sendo territorialmente competente a delegação ou subdelegação em cuja área de jurisdição se haja verificado a infracção.(art.º 631.º do CT)
As principais infracções nesta matéria são(CT, art.º 671.º)
1. no domínio dos princípios para a gestão da prevenção na empresa e cooperação entre empresas que laboram no mesmo local de trabalho, formação, informação e consulta dos trabalhadores e comunicação de acidentes de trabalho( CT, art.º s 272.º a 280.º e RCT art.º s 212.º,213.º, 239.º,b) e 257.º);
2. quanto ao planeamento, programação, organização e avaliação das actividades de segurança, higiene e saúde no trabalho( RCT art.º s 213.º a 263.º);
3. no domínio dos representantes dos trabalhadores para a shst(CT art.º 277.º e RCT art.ºs 264.º a 289.º e 485.º);
4. quanto a regras de protecção de grupos de trabalhadores mais vulneráveis, nomeadamente menores (CT art.º s 53.º a 70.º e art.º 476.º do RCT) e mulheres grávidas, puérperas ou lactantes (CT art.º s 45.º a 49.º e art.º 475.º do RCT);
5. quanto à responsabilidade sobre os danos emergentes do acidente de trabalho e doença profissional, nomeadamente celebração do contrato de seguro de acidentes de trabalho, ocupação e reabilitação do trabalhador( CT art.º s 288 e seguintes.);
6. protecção do património genético(art.º 474.º do RCT)
7. serviços de segurança, higiene e saúde no trabalho (art.º 484.º do RCT)
O CT, seguindo o exemplo do antigo Regime Geral das Contra-ordenações laborais (art.º 10.º da Lei n.º 116/99 de 4/8) estabelece no preceituado pelo n.º1 do art.º 622.º, sob epígrafe: “Critérios especiais de medida da coima” o agravamento dos limites máximos das coimas aplicáveis a contra-ordenações muito graves, previstos no n.º 4 do art.º 620.º, atendendo à natureza das infracções. Assim, e no âmbito do tema que estamos a tratar, as infracções que versem normas sobre trabalho de menores e shst (...) vêm o seu limite máximo elevado para o dobro. Esta é uma previsão legal que “relembra” mais uma vez ao infractor o valor dos bens jurídicos em causa: a vida, a integridade física ou psicológica do trabalhador. Não raro no quotidiano, o simples levantamento de um Auto de Noticia por contra-ordenação muito grave, em matéria de shst, onde vão previstas as molduras contra-ordenacionais agravadas nos termos acima referidos, alerta os infractores para a gravidade dos seus comportamentos.
O n.º2 do art.º 622.º do CT é um preceito legal novo que também conduz a um agravamento das coimas. Em matéria de shst, sobretudo em estaleiros de construção civil é comum encontrarem-se em obra em simultâneo vários empregadores, normalmente segundo uma cadeia de subcontratação que começa com: Dono de Obra - Entidade Executante(ou Empreiteiro Geral)- Subempreiteiro - Sub-Subempreiteiro... A estrutura organizacional e financeira (e em suma, o volume de negócios da empresa- art.º 620.º, n.º1 do CT) do topo desta cadeia é, por norma, substancialmente superior aos Subempreiteiros de subemepreiteiros... Pelo que a experiência revela-nos que este preceito legal poderá significar um agravamento substancial das coimas a aplicar a estes últimos, (pequenas empresas, trabalhadores independentes, etc), nalguns casos bastante pesadas, já que naquele ramo de actividade a maioria das infracções são tipificadas como muito graves.
Ainda no que concerne a cadeia de subcontratação e infracções muito graves, refira-se a previsão legal contida no art.º 617.º, n.º2 do CT, segundo a qual, o contratante responde solidariamente pelo pagamento da coima do subcontratante, que executar toda ou parte do contrato nas instalações daquele ou sob sua responsabilidade (salvo demonstrando que agiu com a diligência devida).
A violação do dever do trabalhador zelar pela sua segurança e saúde e pela das outras pessoas que possam ser afectadas pelas suas acções ou omissões no trabalho (art.º 274.º, n.º 1, b) do CT), constituí hoje, contra-ordenação muito grave nos termos do art.º 671, n.º 1 do CT. Este dever dos trabalhadores foi transcrito do Regime Jurídico do Dec. Lei n.º 441/91 de 14/11, art.º 15.º, sob epígrafe: “Obrigações dos Trabalhadores” do n.º1, alínea b). E a contrario sensu do art.º 24.ºA (introduzido pela Lei n.º 118/99 de 11/8) desse diploma legal, não estava tipificada nenhuma contra-ordenação para a sua violação.
Esta nova previsão legal, tipificando uma contra-ordenação cujo sujeito/infractor/agente(vide art.º 617.º, n.º1 do CT) é o trabalhador, causa-nos, sobretudo por se tratar de matéria de segurança e saúde, alguma preocupação. De acordo com o art.º 614.º do CT, “constitui contra-ordenação laboral todo o facto típico, ilícito e censurável que consubstancie a violação de uma norma que consagre direitos ou imponha deveres a qualquer sujeito no âmbito das relações laborais e que seja punível com coima.” [26] Quer no regime actual, quer no regime anterior existem contra-ordenações cujo sujeito não é o empregador, pense-se p.ex. nos casos do art.º 17.º, n.º3 do CT( em que o sujeito infractor é o médico); art.º 117.º, n.º1 do CT( em que trabalhador e empregador podem ser infractores) e outros, mas na esmagadora maioria dos casos os sujeitos das contra-ordenações são os empregadores.
Pensamos, que se trata de uma responsabilização do trabalhador, quiçá desnecessária, porque o próprio empregador sempre pôde (antes- vide art.º 9.º, n.º2, h) do Dec. Lei 64-A/89 de 27/2 como agora- art.º 396.º, n.º3, h) do CT) “reagir” contra faltas culposas do trabalhador em matéria de observância das regras de higiene e segurança no trabalho, que pela sua gravidade e consequências tornem imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral.( tipificando portanto uma justa causa de despedimento).
Ainda que se possa dizer ( e é verdade) que estejamos obviamente a comparar preceitos com previsões legais diferentes, com objectivos díspares , o art.º 274.º, n.º1, b) do CT, consubstancia-se num dever geral do trabalhador para consigo e para com outrem, de zelo pela segurança e saúde e o art.º 396.º, n.º3, h) do CT trata-se da definição de uma justa causa de despedimento por violação das regras de higiene e segurança no trabalho, afinal ambos visam, ainda e também, garantir o cumprimento das normas de shst, a prestação da actividade em condições de segurança e higiene.
Acrescento também, que certamente poucas serão as acções ou omissões da parte do trabalhador, no seu trabalho que se traduzam em infracções à segurança e saúde do próprio ou de outrem pura e simplesmente , isto é, que possam excluir por si só a responsabilidade do empregador nesta matéria.(art.º 274.º, n.º 5 do CT) Pelo que também por esta via nos parece poder ser dispensável a responsabilização contra-ordenacional do trabalhador nos termos referidos.
Para concluir refiro que a coima, neste caso, aplicável ao trabalhador, será aferida nos termos do art.º 621.º do CT, coimas fixas, visto não existir (obviamente) volume de negócios.
Importa ainda referir que além da responsabilidade contra-ordenacional, o CT identifica a violação de diversas normas que comina com responsabilidade criminal: os “crimes laborais”.(CT art.º 607 e seguintes e RCT art.º 465.º e seguintes.)
No que concerne à criminalização de comportamentos que violem disposições em matéria de shst encontramos : a utilização indevida do trabalho de menor, (art.º 608.º do CT e art.º 152.º do Código Penal) a desobediência -qualificada- a ordens da IGT para a cessação imediata da actividade do menor; (art.º 609.º do CT e art.º 348.º, n.º s 1 e 2 do Código Penal) a desobediência qualificada sempre que o empregador não apresente à IGT os documentos ou outros registos por esta requisitados que importem ao esclarecimento de situações laborais em suma ao normal exercício da actividade inspectiva,[27] bem como a própria ocultação, destruição ou danificação de documentos ou outros registos requisitados pela IGT.( art.º 468.º do RCT e art.º 348.º, n.º s 1 e 2 do Código Penal)[28] Nestas situações compete à IGT elaborar participação crime e instrui-la de todos os elementos probatórios documentais ou outros remetendo-a ao Ministério Público. (art.º10.º, n.º1, i) do Estatuto)


7. CONCLUSÕES

A legislação laboral em vigor até à Lei n.º 99/2003 de 27 de Agosto carecia de sistematização, revisão e adaptação às novas necessidades da organização do trabalho e ao reforço da produtividade e competitividade da economia nacional.[29]
O CT não sistematizou (nem poderia ou deveria fazê-lo, na nossa opinião) toda a legislação de shst, sob pena de prejudicar um dos objectivos da codificação, que é justamente reunir num só diploma legal toda a legislação sem perder de vista também a facilidade de consulta, análise... Na verdade, a legislação de shst comporta diversos diplomas legais, contendo normas técnicas, específicas para determinados riscos profissionais ou sectores de actividade.
No tocante à shst pretendeu-se então a definição de princípios gerais nesta matéria e a consagração de um princípio geral sobre prevenção de acidentes de trabalho, enumerando-se os correlativos deveres dos sujeitos da relação laboral.
A inclusão da shst no Código, é quanto a nós positiva e significa um “crescer” da sua importância relativa.
Por outro lado, o RCT complementou os princípios gerais contidos no CT e procedeu à regulamentação de diversas matérias entre as quais: protecção do património genético(agentes biológicos, cancerígenos e químicos); medidas de promoção da segurança e saúde de mulheres grávidas, puérperas ou lactantes; serviços de shst; comunicação de acidentes de trabalho; regime de eleição dos representantes para a shst ...
Na verdade compulsadas estas matérias, verificamos que as mesmas correspondem no essencial à transposição de Directivas Comunitárias sobre shst, como: Directiva n.º 89/391/CEE do Conselho de 12 de Junho; Directiva n.º 92/85/CEE, do Conselho de 19 de Outubro, entre outras[30], bem como ao desenvolvimento de diplomas como os Decretos-Lei n.ºs 441/91 de 14/11 e 26/94 de 1/2.
Neste trabalho procurou-se sobretudo perspectivar o contributo que a IGT pode trazer à implementação dos princípios da prevenção, dada a proximidade, no quotidiano, nos locais de trabalho que visita, fazer desta Instituição um parceiro privilegiado no conhecimento das dificuldades e ou constrangimentos que o sistema comporta.
Não pretendíamos fazer uma análise exaustiva de todos os preceitos legais em matéria de shst (contidos no CT e no RCT), já que tal não se compadeceria com o teor de um trabalho de pós-graduação como este, mas tão só contribuir para a reflexão sobre alguns problemas que assomam o nosso espírito, sobretudo que se prendem com o exercício das nossa actividade profissional.
Caminhamos para uma sociedade em que bens e serviços são cada vez mais certificados quer por cumprirem com a política ambiental, quer com as normas da qualidade e já vão surgindo empresas que procuram reunir não só estas certificações, mas também a de segurança, higiene e saúde no trabalho.
A cultura de prevenção deverá integrar todas as decisões de gestão dos empregadores por forma a contribuir não só para a diminuição de Acidentes de Trabalho, mas também para uma melhoria do bem-estar no local de trabalho.
O CT dignificou a matéria, o RCT trouxe-lhe novos desenvolvimentos, e o tempo dirá se as estatísticas de sinistralidade laboral, reflectirão nos seus números, as intenções do legislador.




Santarém, 15 de Novembro de 2004


(Teresa Paula Infante C. M. Meneses Cardoso)

Jurista - Inspectora do Trabalho






























BIBLIOGRAFIA:

JORGE LEITE E F.JORGE COUTINHO DE ALMEIDA- Código do Trabalho, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 2004

PEDRO ROMANO MARTINEZ, LUÍS MIGUEL MONTEIRO, JOANA VASCONCELOS, PEDRO MADEIRA DE BRITO, GUILHERME DRAY E LUÍS GONÇALVES DA SILVA-Código do Trabalho –anotado, 3.ª Edição, Almedina, 2004

FERNANDO A. CABRAL E MANUEL M. ROXO- Segurança e Saúde no Trabalho-Legislação Anotada, Almedina, Fevereiro 2000

IDICT- Sistemas de gestão da segurança e saúde no trabalho, Directrizes práticas da OIT, Série: Informação Técnica n.º15, 1.ª Edição, Abril de 2002

IDICT- Livro Branco dos serviços de prevenção das empresas, Série: Estudos/1,segurança e saúde no trabalho, 2.ª Edição, Maio 2001

SUB JUDICE –revista n.º 27 de 2004
































INDICE

Abreviaturas e siglas utilizadas..................................................................................................2
1. Introdução.......................................................................................................................3
2. Alguns conceitos da segurança, higiene e saúde............................................................3
3. Quadro normativo e regulamentar..................................................................................4
4. O Direito à segurança, higiene e saúde no trabalho........................................................5
5. O Dever de segurança, higiene e saúde no trabalho.......................................................9
6. O papel da IGT na segurança, higiene e saúde no trabalho..........................................11
6.1. Enquadramento normativo e regulamentar..................................................................11
6.2. O sistema de inspecção e os limites da sua acção........................................................11
6.3. Algumas especificidades da sua actuação-os acidentes de trabalho............................13
6.4. Actuação em relação às empresas prestadoras de serviços de higiene e segurança no trabalho.........................................................................................................................15
6.5. O exercício da função sancionatória e as forma de actuação do inspector do trabalho.........................................................................................................................17
7.Conclusões........................................................................................................................21
Bibliografia consultada........................................................................................................23

















[1] O diploma que regia esta matéria anteriormente: Dec.Lei 26/94 de 1/2, previa nos termos do seu art.º 5.º, n.º3 a necessidade de recorrer a serviços internos no caso da empresa ter expostos pelo menos 50 trabalhadores, pelo que hoje a exigência é ainda maior.
[2] Segundo o Dr. Pedro Romano Martinez o CT foi muito “minucioso” no tratamento desta matéria, quando deveria apenas ter enunciado os princípios gerais, relegando para o RCT o respectivo desenvolvimento detalhado. Cremos no entanto, que esta “ minúcia” no CT vem dar à matéria em questão-shst- outra dignidade, que já merecia há muito... aliás como este autor acaba também por referir. Na verdade é necessário cada vez mais que a segurança e saúde dos trabalhadores seja encarada como uma prioridade absoluta, não só para os empregadores e trabalhadores mas para o Estado, que é quem dita “as regras do jogo” em “primeira mão”.
[3] Esta Directiva é de carácter horizontal aplicando-se indiferenciadamente a todos os sectores e ramos da actividade económica, pública ou privada, tendo como objectivos fundamentais: melhorar a segurança e saúde dos trabalhadores nos locais de trabalho; constituir o quadro jurídico de referência a ser respeitado pelas Directivas especiais que são normas jurídicas de conteúdo acentuadamente técnico; estabelecer critérios gerais da política comunitária sendo referência obrigatória para a interpretação das restantes Directivas e normas nacionais de harmonização.
[4] O Dec. Lei 441/91, introduziu o conceito de “ sistema de prevenção de riscos profissionais” com o objectivo de coordenar e articular a intervenção de todas estas entidades como p.ex.: feitura de legislação, licenciamento de actividades económicas, certificação, investigação, formação, informação, serviços técnicos de prevenção e vigilância da saúde, fiscalização... Ao IDICT (futuro Instituto de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho), caberia o papel de pivot , de elo de ligação (e dinamização), entre as instituições que fazem parte da Rede de Prevenção de Riscos Profissionais.

[5] A definição de “componentes materiais do trabalho” anteriormente contida no D.L.441/91, art.º3.º, f) hoje consta do art.º 213., n.º 1,º b) do Regulamento do Código do Trabalho.
[6] De uma forma sintética estes são os principios:1.Evitar os riscos; 2.Avaliar os riscos que não podem ser evitados;3. Combater os riscos na origem; 4. Adaptar o trabalho ao homem; 5.Realizar estes objectivos tendo em conta o estado de evolução da técnica;6. Substituir tudo o que é perigoso pelo que é isento de perigo ou menos perigoso; 7. Integrar a prevenção dos riscos num sistema coerente que abranja a produção, organização, condições de trabalho e diálogo social; 8.Priorizar a protecção colectiva face á protecção individual; 9. Substituir o que é perigoso pelo que é isento de perigo ou menos perigoso; 10.Formar e Informar os trabalhadores.
[7] Local de trabalho é nesta óptica, qualquer lugar, espaço físico onde o trabalhador presta a sua actividade, onde o trabalhador tenha de ir ou em que deva permanecer por razões de trabalho efectuado sob o controlo de um empregador.
[8] Vide regulamentação sobre licenciamento industrial, em especial: Dec. Lei n.º 69/03 de 10/4 e Decreto Regulamentar n.º 8/03 de 11/4
[9] Estatuto da IGT, art.º10.º, n.º1 g)
[10] Estatuto da IGT, art.º 10.º, n.º 1 c)
[11] Estatuto da IGT, art.º 10.º, n.º1 d)
[12] Estatuto da IGT, art.º 10.º, n.º 1 i)
[13] Estatuto da IGT, art.º10.º, n.º1, e)
[14] Disposição idêntica encontramos noutros diplomas como: art.º 24.º do D.L.273/03 de 29/10( e anteriormente a este no D.L.155/95, de 1/7) quanto aos acidentes de trabalho ocorridos em estaleiros temporários de construção civil
[15] Segundo alguns autores aqui reside a diferença entre acidente e incidente, caracterizando-se este último por ser uma acontecimento imprevisto no decorrer do trabalho ou em relação com o trabalho, sem que alguém sofra lesões corporais.
[16] Anteriormente a este diploma regia esta matéria o art.º13.º do Dec. Lei n.º 155/95 de 1/7.
[17] O CT (art.º 276.º),mas sobretudo o RCT(art.º s 218.º a 263.º), fez um especial enfoque( e quanto a nós ainda bem) na regulamentação dos serviços de shst, quer no tocante à sua identificação/estruturação, quer no tocante ao seu funcionamento. Parece-nos que o legislador concluiu que o Dec.Lei 26/94 de 1/2 volvidos estes anos, não conseguiu atingir plenamente os seus objectivos. Assim, impõe-se mais uma vez, trazer à colação uma matéria que se assume da maior relevância, já que na maioria dos casos os empregadores não possuem os conhecimentos ou preparação /formação técnica para assegurarem as actividades de shst. Por outro lado, hoje já existem no nosso sistema educativo cursos certificados, técnicos creditados e estão em fase de acreditação muitas empresas de shst que laboram no nosso mercado, pelo que era este o momento ideal para “reavaliar ou reescrever” o Dec.Lei 26/94.
[18] Revisto pela Lei n.º 7/95 de 29/3 e D.L. 109/00 de 30/6( nova redacção, aditamentos e renumeração)
[19] Anteriormente esta matéria era regulada pelo art.º 13.º do Dec. Lei n.º 26/94 de 1/2
[20] Necessidade esta depois transposta para a al.a) do n.º 2 do art.º 23.º do D.L 441/91
[21] Estatuto da IGT,art.º10,n.º1,c)
[22] Estatuto da IGT art.º 5.º,n.º 2 ,art.º 17.º, n.º2 da Convenção n.º 81 da OIT;art.º 632.º do CT
[23] Estatuto da IGT,art.º10,n.º1,d)
[24] O recomeço dos trabalhos só pode acontecer depois de autorização expressa (formalizada)da IGT( art.º 10, n.º2 do Estatuto da IGT), sob pena de se incorrer na prática de um crime de desobediência (art.º 348 do Código Penal).
[25] Estatuto da IGT, art.º 6.º e 7.º
[26] No regime geral das contra-ordenações laborais (Lei 116/99 de 4/8) o art.º 1.º que continha a definição de contra-ordenação laboral era complementado pelo art.º 4.º onde se enunciavam depois os sujeitos responsáveis pela infracção.

[27] De acordo com o Estatuto da IGT(art.º13, n.º2) a falta de apresentação de documentos ou registos requisitados nos termos da alínea e) do art.º 11.º daquele diploma constitui contra-ordenação leve, sem prejuízo do disposto relativamente a documentos ou registos obrigatórios.
[28]Ás pessoas colectivas responsáveis pela prática dos crimes previstos no art.º 608.º e 609.º do CT pode ser aplicada a pena de multa e /ou a interdição temporária de exercício de actividade de dois meses a dois anos, ou a privação do direito a subsídios ou subvenções públicos num período que pode variar de um a cinco anos.

[29] Vide exposição de motivos da proposta de CT.(proposta de lei n.º 29/IX)
[30] Vide exposição de motivos da proposta de RCT.(proposta de lei n.º 109/IX)

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